domingo, 13 de novembro de 2011

Jardim Florido




Era um final de tarde bucólico...
Estávamos sentadas na varanda em frente ao jardim florido, uma leve brisa de verão e as cortinas brancas levemente balançando. O cheiro do café e do bolo invadindo os sentidos… Sentadas a mesa, convidadas de honra: Cecília Meireles e Clarice Lispector.
Eu estava muito agradecida em ter comigo a visita destas personalidades ilustres, mulheres a frente de seu tempo, com pensamentos clássicos que perduram…
Olhei para Cecília como quem ia oferecer açúcar ou adoçante e parecia que ela havia lido meu pensamento, feito um mapeamento da minha vida e disse:
Em toda a vida, nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou o sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha personalidade.

E eu continuei:
Concordo… Tudo é efêmero diante do destino, do acaso e principalmente diante da nossa impotência. Nada depende de nós… é duro admitirmos que não possuímos  esse poder. Esta tudo nas mãos do acaso…
Clarice toma um gole de café e fala calmamente:
Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento.
Olhei espantada e Cecília estava pensativa com sorriso nos lábios. Clarice tomou outro gole de café e com um sorriso discreto, continuou:
Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada.
Eu estava extasiada, expondo meu ponto de vista sobre a Vida para elas:
Não quero significar, isso é muito limitado… Só quero viver. Sou espontânea quanto o vento… Faço o que me dá na cabeça. Sou de veneta! Não sei ser diferente.
Cecília tomou fôlego e disparou:
Adestrei-me com o vento e minha festa é a tempestade.
Entreolhamo-nos e sorrimos. Continuei:

Gosto do vento, ele vai pra onde quer e não tem tempo de escutar o que os outros falam… E quando ele fala, todo mundo escuta!
Clarice levantou-se, acendeu um cigarro. Estávamos em silêncio e comecei a recolher as coisas que haviam sobre a mesa e o vento levou o guardanapo ao chão próximo aos pés dela. Abaixou-se delicadamente, entregou-me com um sorriso tímido e disse:
Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania. Depende de quando e como você me vê passar.
(continua)
(continua)